Outro epílogo

Outro epílogo. Outro prólogo? Não sei. Espaço já abandonado, agora entra em recesso sem data para retorno. O termo recesso vem a ser um eufemismo para encerramento, o que é de facto. Publiquei alguns posts a tempos esquecidos nos rascunhos, nas datas em que foram escritos, por questão se sentido/lógica (ou seja, lá nos meses passados). Creio que não mais publicarei aqui. Talvez, por ventura, no futuro, mas não está nos planos. Espaço encerrado, até segunda ordem. É uma pena, que não tenha tido tempo de compartilhar mais ou melhor minhas experiências. Foram e estão sendo tão intensas, mas não é possível sentar para escrever tudo. Na verdade, tenho escrito, em meu moskeline, sempre comigo, para mim. Melhor assim, talvez. Filtra-se desnecessidades de serem publicadas. Há muitas anotações que seriam muito interessantes de serem publicadas, mas creio que não o será. Uma pena, este projeto não foi à frente. Não mais blogs pessoais, por enquanto. Epílogo sem prólogo. Bye.

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário

Portas Fechadas

PARIS – As portas da assembleia nacional francesa estão fechadas. Cerradas. Closed. Cá em outros cantos tomamos uma perspectiva às vezes deturpada, idealizada, do estrangeiro. No caso da França, por sua história de lutas, seria uma terra de liberdades, em que os cidadãos lutavam por seus direitos, por liberdade, democracia. Mas a França não é assim tão democrática.

Como pesquisador da área de Gestão Pública, me interesso pelos sistemas administrativos e legislativos dos diversos países. Tentei ir à assembleia nacional francesa, mas não pude entrar.

Não pude entrar, não por alguma restrição não atendida, mas por que ninguém pode entrar. É normal e legítimo que cada casa estabeleça regras de funcionamento, às vezes incoerentes, mas legítimo. Em Portugal, há que se “agendar” antes, se inscrever na lista dos que irão assistir à sessão (questão do número de cadeiras, etc). No Brasil, é necessário vestir terno para poder pisar dentro do parlamento (questão de respeito, dignidade). Mas não há nada disso em França. A assembleia simplesmente está fechada, as reuniões são privadas. “não é um lugar para turismo”, disse o guarda. Não é apenas com “estrangeiros”; mesmo os franceses não podem ascender ao parlamento. E onde fica o direito dos cidadãos que desejam acompanhar o trabalho de seus representantes? E a democracia?

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário

Sorbonne, Paris

PARIS – Nesse momento escrevo da biblioteca de Sorbonne, a mais famosa e tradicional universidadedo mundo. Escrevo diretamente no wordpress (não como comumente no word) para poupar tempo. A entrada aqui é proibida; não é permitido visitas (mesmo acadêmicas) à Sorbonne. Mas adivinha? Cá estou. Se continuar assim, vou me tornar especialista em entrar em lugares não-permitidos. Hehe.
Hoje pela manhã meu hostel pegou fogo; foi divertido ver (e filmar) todo mundo correndo. Espero ter tempo para editar um vídeo com as gravações.
Estou gostando de Paris, bem mais do que da Riviera Francesa, que não gostei muito. Basicamente só tem turista na cidade. Haha. Aliás, esse papel de turista já está me cansando, no terceiro dia nessa pele. Gosto disso aqui, estar numa biblioteca, ou num café, ou numa praça, e sentir a alma da cidade, que não é a parte turística.
Bom, não tempo muito tempo, então lá vou eu. 🙂

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário

End of Journey

O sistema de som do métro (pronuncia-se métro, com acento agudo no é) da cidade do Porto avisa sobre suas paragens em português em inglês. Diz a voz metálica: “Próxima paragem: aeroporto. Fim de linha.” Para logo em seguida vir o aviso em inglês: “Next stop: airport. End of journey”. Fim da jornada, seria outra tradução possível para a frase em inglês, e muito própria a este momento.

Sempre que ouvia esse aviso no metro me remetia, mentalmente, a um dos melhores episódios de Doctor Who, série inglesa que aprecio muito. “End of journey”, foi o episódio que foi ao ar no natal de 2009 e que marcou a pré-despedida de David Tennant do papel. No episódio seguinte, morria o Doutor, para renascer outro. No episódio da morte do Doutor, diz o Odd na hora agonizante, enquanto canta para seu adormecer, momentos antes de sua partida “Essa canção termina, mas a história nunca acaba”. Morte e renascimento. Esta canção termina. End of journey.

Quando planejei esta viagem de dois meses na estrada, pensei que voltaria à Portugal e só então me despediria de facto dessa terra. Percebo agora que minha despedida já foi. Despedi-me de meus queridos amigos, pessoas fantásticas que conheci aqui. Despedi-me de todos, do apartamento da Areosa onde vivi por cinco meses. Esvaziei gavetas e guarda-roupa. Ver as minhas gavetas, sempre tão absurdamente bagunçadas, vazias, deu verdadeiramente o sentimento de despedida, tal como se, como o espaço físico, também vazio estivesse o espaço simbólico. Este não está, pois carrego as pessoas em meu coração e memória. As coisas deixadas em malas; ainda retorno para apanhar apanhá-las, mas então todos já terão partido. Uma casa vazia, é o que encontrarei, tal como Carlos da Maia ao visitar pela última vez a casa da família. Apenas um epílogo.

Despeço-me de Portugal. Mas, sabe, o título dessa postagem está errado. Este não é o fim da jornada, é apenas o inicio dela. Mesmo depois que retornar e me for, ainda será apenas o inicio da jornada. Esta é a vírgula que representa um intervalo ou a mudança de capítulo, talvez. N’algumas horas estarei em Paris. Começa outro capítulo, outra aventura, outra canção, como a do Doutor. A história não acaba, disse o Odd. Lá vamos nós, ou como dizem os franceses, allons-y.

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário

Malick, Deus e a “Árvore da Vida”

Malick, Deus e a “Árvore da Vida”

Por Márcio Carlomagno

CANNES – O vencedor da Palma de Ouro em Cannes no último domingo, dia 22, “The Tree of Life” (A Árvore da Vida), traz uma nova e verdadeira obra de arte do diretor Terrence Malick.

O filme começa com os personagens principais, interpretados por Brad Pitt e Jessica Charstain recebendo a notícia da morte de seu filho. A partir disso, o filme se enreda nos lamentos sobre a morte e a vida e então surgem as lembranças da vida do jovem.

Os personagens dialogam com Deus, que se manifesta na belíssima fotografia de Emmanuel Lubezki. Os diálogos com o divino não são bem um “questionamento da fé”, como apontam algumas sinopses do filme, mas um diálogo, um lamento de luto, em busca de um entendimento sobre a vida e a morte. E nisso, a narrativa entra nessa tentativa de compreendimento.

Assim como Stanley Kubrick não temeu alongar seu “2001: uma odisseia no espaço” com longas sequências do espaço vazio, Malick não teme mergulhar em longas sequências do espaço e da criação do mundo. Imagens deslumbrantes do sol ardendo e de planetas em luz e sombra que provavelmente seriam impossíveis fisicamente, mas que deslumbram os olhos na bela composição de fotografia. Talvez a melhor representação que o cinema já concebeu de Deus e da criação. O mergulho de Malick nesses tempos primórdios dá direito à aparição até de dinossauros na tela, em sequência que, por estranho que se pareça dizer isso, não é estranha, mas coerente com o filme.

Se equivocará quem esperar por uma narrativa tradicional, uma storyline que possa ser resumida com começo, meio e fim. Não há isso. Embora se possa inferir um começo, meio e fim, não há uma progressão com um propósito. O filme poderia ser um recorte de um diário pessoal; e é isso que ele nos traz. Fragmentos da história de uma vida.

A câmera de Malick está em consonância com a perspectiva de “fragmentos de um diário”. Usando o recurso de “câmera na mão”, deixando os planos fixos de lado, os nossos olhos aproximam-se e retornam dos personagens, movem-se para os lados, tal qual nossa visão. O tom intimista predomina e é esse o intuito que bem-sucedidamente Malick alcança: nos fazer sentir parte da família, parte daquele mundo.

A evolução do personagem de Brad Pitt na pele de um pai duro, que quer fazer de seus filhos homens melhores do que ele próprio e com isso ultrapassa os limites, é visível na tela. Nota-se a mudança sutíl do personagem, nem sempre um homem duro. Conforme o passar dos anos, as relações entre pai e filho vão se estilhaçando. A delicada construção merece aplausos, tanto para a direcção de Malick quanto à atuação de Pitt. Também Jessica Charstain está excelente como a mãe submissa ao esposo.

O diretor Terrence Malick é famoso por sua arte e pelos longos intervalos entre a produção de um filme e outro – o maior desses intervalos foi de 20 anos, entre “Days of Heaven” (Cinzas no paraíso/Dias do paraíso, de 1978), e “The Thin Red Line” (Além da linha vermelha/A barreira invisível, de 1998). A realização de “The Tree of Life”, para não fugir à regra, estourou as previsões e o filme demorou 1 ano a mais para ser concluído do que o previsto (Malick cancelou a estréia na véspera, em maio de 2010, para decidir re-editar o filme). A obsessão de Malick com a perfeição pode encontrar paralelo não apenas em Stanley Kubrick (também famoso por peripécias análogas), mas em seu próprio filme. Conversando com seu filho, o personagem de Brad Pitt conta a determinada altura: “Toscanini gravou a mesma peça 46 vezes. Sabe o que ele disse quando terminou? ‘poderia ser melhor’.”. Certamente é o que disse Malick, para si mesmo, mesmo com a Palma de Ouro em suas mãos: “Poderia ser melhor”.

Publicado em Uncategorized | 1 Comentário

Tradições portuguesas

Há muitas tradições em Portugal. Sobretudo na Universidade, ainda se preservam tradições que remontam a muitos e muitos séculos. Portugal é, provavelmente, o país europeu em que mais se preservam as tradições acadêmicas, já não mais adotadas por outros países. Nessa semana ocorreu a Semana de Queima das Fitas. Esta é mais uma das tradições e irei chegar nela, mas antes, há um caminho de tradições acadêmicas a percorrer.

Quando se chega à, no meu caso, Universidade do Porto (o mesmo vale para qualquer outra universidade em Portugal), logo se cruza com pessoas pelos corredores trajando roupas formais, sobretudos e capas (!). Esta é a primeira imagem e o primeiro contato que se têm com as tradições, que você ainda está para descobrir. Pela primeira vez pensei que fosse algum evento especial, uma formatura, provavelmente, mas aquilo continua nos dias e semanas seguintes.

O chamado traje acadêmico é uma roupa formal composta, para os homens, por calça, camisa branca, gravata, colete, batina (uma espécie de sobretudo) e capa. Sim, capa, tal qual em filmes de mágicos. Para as mulheres, a variação é trocar calça por saia abaixo dos joelhos. Com exceção da camisa branca, o traje é todo em preto, resquício do negro das batinas eclesiásticas. O uso do traje acadêmico começou na Universidade de Coimbra, no século XVI, e servia para separar a classe universitária (de pensadores) dos “outros”, e perdura até hoje. O traje acadêmico é uma espécie de uniforme escolar das universidades portuguesas. Não apenas “uma espécie”, mas literalmente o uniforme oficial da Universidade (não obrigatório, evidentemente). Embora “uniforme não obrigatório”, há muita gente que faz esse uso dele, e o usa diariamente. Pessoalmente, acho lindos os trajes acadêmicos e desejo ter um, andar com um por aí.

O traje acadêmico (retirei uma imagem da internet para não fazer uso indevido de nenhuma fotografia que tirei de outrem)

Mas o traje acadêmico é só um dos elementos que faz parte de algo maior, mais global. Chama-se Praxe. E o que é a praxe? É, por assim dizer, um ritual de iniciação aos calouros na universidade. Ora, alguém vai dizer, isso existe no Brasil, é o trote. Não, não é. É algo muito mais profundo. Enquanto no Brasil os “trotes” duram apenas uma semana, em Portugal a praxe dura um ano! Sim, todo o primeiro ano de “caloiro”! Eu, que detesto o discurso “politicamente correto” que o Brasil (e a minha universidade, UFPR) tem adotado nos últimos anos para coibir os trotes, me encantei com isso. Fico imaginando como seria a reação dessa gente politicamente correta ao saber de certas coisas que ocorrem na praxe e seu tempo de duração.

O que ocorre na praxe, creio, não é muito diferente dos trotes brasileiros, com a diferença da duração. Aqui, a praxe é uma tradição respeitada. Ela é, inclusive, realizada dentro dos campus da Universidade. Há sempre os que não gostam, que protestam, que querem acabar com ela. Movimento crescente, inclusive, que deve ser respeitado. Mas, assim como no trote brasileiro, participar da praxe é uma escolha pessoal – sempre é possível não fazê-lo. “Nunca foi meu sonho de criança andar de quatro”, disse-me uma amiga, ao dizer por que não participava da praxe. Um episódio que marcou minha memória foi, logo no primeiro mês que estava em Portugal, numa noite em Coimbra, em frente a uma “disco” (discoteca), uma “doutora” (como são intitulados os veteranos) chegou em sua caloira. A caloira, por ordem da veterana, ajoelhou-se perante ela, depois ficou de quatro, e cantou alguma canção que já não recordo. Isso em frente a dezenas de pessoas, no meio da calçada, na diversão da noite (não em uma prática de “trote”). Ou seja, a praxe é perene, não tem hora, ela ocorre a todo o tempo. Durante um ano!

A praxe se destina a iniciar os caloiros no meio, lhes ensinar valores, respeito, e com o tempo cria-se um sentimento de unidade no grupo. A partir do momento que deixam de ser caloiros, fazem parte de um seleto grupo.

Ah, as vestimentas. Apenas os “doutores” (veteranos) podem usar o traje acadêmico. É assim que se diferenciam dos caloiros e demonstram seu poder e superioridade. E, embora seja o traje oficial da Universidade, o uso corrente que se dá ao traje é que somente pode usá-lo quem é da praxe.

E finalmente chegamos à Queima das Fitas. Este é O evento acadêmico do ano. O mais aguardado de todos. Tradicionalmente, é o rito de passagem dos finalistas dos cursos, como uma espécie de formatura. Mas esse evento é aberto a todos. O nome da festa é por que os finalistas (formandos) usam fitas em suas pastas, como um símbolo (hoje é um símbolo, no passado as fitas eram usadas para amarrar/fechar as pastas, uma vez que não existiam fechos). No fim do curso, eles queimam as fitas, pois já não precisam delas. Bom, hoje é muito mais simbólico. No passado, queimavam as fitas e rasgavam o traje acadêmico. Hoje, não queimam nem rasgam nada, mas o símbolo ainda é preservado. Na prática contemporânea, o que ocorre é uma festa de uma semana (feriado escolar), regada a música e bebida. Mas o símbolo permanece. Nota: do traje que era rasgado, apenas a capa se guardava, para o resto da vida. Esta, nunca pode ser lavada, pois contém nela a “energia” de suas experiências.

Também é na Semana de Queima das Fitas que os caloiros deixam de ser caloiros. É realizado um cortejo, em que, sob a música tocada pela tuna, os caloiros vestem pela primeira vez suas capas de veteranos. A partir daí, podem andar trajados. É um belo, belo ritual de passagem. São belas tradições, que ainda são mantidas em Portugal.

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário

Em Marrocos e na África

MARRAQUEXE – Quando, um ano atrás, eu poderia imaginar que estaria andando de camelo no meio do deserto do Saara? A vida é imprevisível e é maravilhoso vivê-la, intensamente, imprevisívelmente. Me sinto vivendo, como diz a música “deixando a vida me levar”. Viagem em companhia, com amigos. Há coisa melhor?

O Marrocos é um universo cultural muito distante, diferente, e isso é maravilhoso. Ficamos num hostel exatamente na Praça Djeema El Fna, coração de Marraquexe. No dia que chegamos, um atentado terrorista havia explodido um café-restaurante ao lado de nosso hostel. Da sacada, dava pra ver os destroços e a perícia recolhendo as provas. Curiosidade macabra.

Quando chegamos ao hostel e ouvi, vindo do pátio central (com uma enorme palmeira de ultrapassava os quatro andares do prédio), o “chamamento”, o canto que vem da mesquita central e atinge toda a cidade por alto-falantes, chamando os mulçumanos para a hora da oração, foi uma das coisas mais lindas que já ouvi. Tão bonito quanto o ato de fé do atendente do hostel, que abandonou o nosso check-in pela metade para se ajoelhar e rezar, e só após isso retomar o trabalho.

Belo assim como o céu estrelado do deserto do Saara. O Saara, devido à conjuntura dos fatores geográficos (proximidade com linha do equador, altitude, planice, etc) é o ponto no mundo onde melhor se pode observar as estrelas, à olho nu. Tem-se a imagem da abóboda estrelar completa, como uma cúpula que nos envolvia. Estrelas no horizonte, nos quatro cantos por onde se poderia olhar.

Ah, o deserto! Em nossa trip deparamos com várias simulações de rituais antigos. Queria acreditar que esse rituais ainda são de facto preservados, mas me pergunto até que ponto são verdadeiros. Nessas situações, sempre me lembro de “Maverick” (o filme), e o índio moderno que fingia ser selvagem para ganhar dinheiro.

Mas uma coisa me impressionou. Na ida ao deserto, no camelo, parte da paisagem desolada me lembrou as cenas de filmes do Vietnam. Cruzamos com uma cabana muito pobre, com crianças à porta. Elas, ao contrário de muitas outras dessa região, não vieram até nós pedir dinheiro. Apenas pararam para nos olhar, passando. Nos olhamos mutuamente e vi a pobreza naqueles olhos. A caravana não parou e simplesmente passamos pela pobreza. Adiante, outras brincavam de futebol com uma bola. São crianças normais, ora pois?! Mas me causou certo mal estar e uma reflexão, apenas passar pela pobreza, sem me envolver com ela. Continuei em meu percurso turístico, mas elas continuarão em sua pobreza.

Tanto momentos belos e mágicos no Marrocos. Casablanca agora é moderna e um centro de negócios. O charme do Rick`s Bar, do filme de com Ingrid Bergman e Humphrey Bogart, agora foi substituído por um McDonald`s à beira-mar. A vista não deixa de ser bonita. A mesquita de Casablanca é a maior do continente africano e a terceira maior do mundo. Tirar os sapatos na entrada e caminhar pelo tapete, apenas escutando os sons e sentindo aquela sensação de meditação e paz, foi outro dos momentos mais belos e pacíficos que tive na vida.

Um dia inteiro é dedicado à compras e ao mercado central (chamado “souks”) que existe na Medina de Marraquexe. É um labirinto gigante de ruelas que não acabam mais. Incrível. Negociar, pechinchar, barganhar sempre, sempre, sempre, o preço. Pode-se encontrar de tudo. Entre a culinária típica, cérebro de carneiro. Embora não tenho gosto de nada, em que outro lugar do mundo você poderia comer cérebro de carneiro, por 1 euro, no “mercado municipal”? A viagem teve muitas emoções e histórias. Muitas.

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário

Itália: Origens

SEREGNO (ITÁLIA) – Quando o avião começa a se preparar para descer em solo italiano e você olha pela janela, finalmente sente aquele frio na espinha e ansiedade, que não sentiu na normalidade da chegada à Portugal. Parece que finalmente está chegando ao seu destino. Você pensa nos desbravadores do mar e no caminho inverso que, 90 anos atrás, partindo de navio, seu avô fez, da Itália ao Brasil. Nos dias seguintes, em uma pergunta rotineira sobre se algum de seus primos já havia estado na Europa, você se dá conta que é primeiro dos descendentes de seu avô a retornar a sua terra natal, retornar à suas origens.

Sem pretensão alguma, posso afirmar que definitivamente minha viagem a Itália não pode ser comparada com nenhuma outra que turista algum fez – ninguém teve essa experiência.

E a experiência na Itália foi incrível não por cidades turísticas (embora isso esteja incluído no pacote, Roma – belíssima!!! – e tudo o mais), mas por que conheci a verdadeira Itália. O interior italiano, a vida italiana, o manjare italiano. Mas principalmente as pessoas, a minha família.

No lugar da assepsia turística das cidades que são o destino comum, uma tarde à beira de um belíssimo lago, em uma cidade do interior, sentado a uma mesa conversando com seus primos enquanto anoitece, ilustra a experiência da verdadeira Itália, não apenas aquela dos cartões-postais.

Percorrer de carro o caminho que meu avô, criança, fazia a pé, visitar a casa da família, onde nasceu e cresceu, que ainda existe e é da família, assim como o moinho e os campos por onde passava e trabalhava, é uma experiência incrível. Um retorno às origens. Fazer uma oração no túmulo de meus bisavós já teria feito a viagem valer a pena.

Mas não apenas o passado, mas pelo presente. Re-conectar dois irmãos (meu avô e sua irmã) separados pela vida e pelo mundo, que se emocionam ouvindo a voz um do outro ao telefone, ainda que em línguas diferentes. Re-conectar a família. Não há palavras, apenas sentimentos e emoção. Uma bela jornada.

Publicado em Uncategorized | 1 Comentário

Um fim de semana em Santiago de Compostela

SANTIAGO DE COMPOSTELA – Quando o comboio está a chegar em Santiago de Compostela, aproximando-se da cidade, ainda fora dela, entra em mais um túnel, como os muitos que cruzou no caminho até ali. Ao sair, numa curva, já está na cidade e os olhos dos passageiros avistam os prédios e ruas. A primeira sensação que se têm, para quem imaginava uma cidade antiga, muito antiga, é um estranhamento e decepção com tanta modernidade. Prédios altos e novos, como você não via há muito tempo, já que não existem (desse modo) em Porto. Saindo da estação de trens, depara-se com ruas de muitas vias, andaimes de reformas, shopping e uma modernidade que em nada diz que aquela cidade é aquela cidade – poderia ser Curitiba, São Paulo, Madri, Lisboa, ou qualquer outra do mundo, não identificável.

Você segue os conselhos angariados na rua e anda, anda, anda por aí. Chega à Zona Velha, e finalmente encontra a ruelas e velharias que buscava. É o antigo que lhe seduz, agrada mais aos olhos.  Sua tia sempre foi fascinada por Santiago de Compostela. Você não sabe qual a reação dela, mas deve ter adorado saber que mora a apenas 200 quilômetros desta cidade, que agora está visitando. Você compra muitos souvernirs. Você adora isso e essa é sua perdição – uma cruz vermelha de Santiago, em madeira, simples, como é própria da fé autêntica (Jesus era um homem simples, carpinteiro); a réplica (em pequena escala – 30 centímetros) da espada de Carlomagno – isto ainda o fará pensar muito na noite e adiante escrever a respeito –, uma fada, em metal, dita da sorte, nua e muito sensual, entre outras coisas mais. Gasta demais, muito demais. Pensa que terá problemas para carregar tanta coisa de volta.

Já está cansado, a caminho de andar até o hostel indicado no posto de informação turística, quando se depara com uma hospedaria. “Santa Cruz”, indica a placa, em pleno coração da zona velha, ao lado de tudo. Entra para saber o preço. 15 euros, o mesmo do hostel, mas por quarto individual. Quarto velho, um tanto antigo. Resolve ficar e entrar o clima dos peregrinos que já passaram por este local. No quarto, há uma escrivaninha, na qual você escreve em seu notebook e fica a pensar quantos já não se sentaram nessa cadeira (estofada e até confortável) para escrever seus relatos de viagem. Tira um cochilo enquanto a câmera carrega – a fada guarda seu sono, colocada à sua cabeceira.

Se informa sobre o que há para se fazer na noite. Fica sabendo de um concerto gratuito na catedral principal da cidade, na qual você ainda não foi, em homenagem aos 800 anos que a Catedral completa, justamente hoje. Coincidência incrível, você não sabia sobre esse aniversário. Dia de festa. Vai ao conserto, conhece uma espanhola na fila com quem assiste a bela apresentação e que lhe dá dicas sobre o que fazer na noite.  A partir d’um momento do conserto a música lhe leva por muitos pensamentos. No folheto explicativo sobre a Catedral outra referência a Carlomagno. Você já havia visto no mapa da cidade, existe nela um “Parque de Carlomagno”. Você deveria saber melhor a história de sua família, mas não sabe. No entanto, já percebeu que alguma influência ele teve por aqui e agora cá está você de volta, mil anos depois. Terrível ser o filho d’alguém importante, deve ser. Carregar um nome destes, então… Por maior que seja, você nunca irá dominar mais da metade do mundo conhecido. Você queria ser grande, honrar seu nome. No entanto, o sentimento não é de lamento, mas de inspiração. Esta é a palavra, você sente-se inspirado a realizar sua obra, honrar seu nome. Inspiração. Muitos falaram sobre a magia existente em Santiago, e não apenas sua tia fã de Paulo Coelho. Mesmo amigos, você já ouviu relatos sobre o magnetismo desse lugar. Começa a acreditar. Começa a sentir. Sente que está diferente, que já não é o mesmo homem.

Você passa pelo seu quarto, que é ao lado da Catedral – você poderia morar num desses, realmente agradou-lhe –, apenas para deixar os papéis que pegou na catedral. Lá fora, vista da janela, muitas pessoas conversam e fazem barulho nas ruas. Há muitos restaurantes de mariscos e coisas do mar, deduz que é a especiaria do local – ainda vai comer algo por ali, antes de voltar. Há muitas ruelas. Exatamente aquele clima que você sempre viu nos filmes sobre a Europa, mas ainda não havia encontrado exatamente aquilo. Finalmente, encontrou o espírito europeu como retratado no cinema. Seus 15 minutos de relato de viagem no notebook acabaram. Salva o arquivo e vai sair. Ainda é meia-noite e a noite está começando. Amanhã as visitas turísticas, por padrão, e não se sabe mais o que vier. Não é possível prever o que encontrará, o que experimentará. Sai para ver. Ainda há muito pela frente nessa viagem.

00:09, de 10/04 –  Fim da primeira parte do relato


A mesa dobrável em madeira do elegante trem da RENFE espanhola se abre e forma a bancada para o notebook. São cinco da manhã da segunda-feira e estou no trem retornando à Portugal.

Santiago é uma cidade para dois. A noite, os cafés e bares, as ruas, o espírito da cidade. Lembrou-me demais a Viena cinematográfica de Before Sunrise (Antes do Amanhecer, no Brasil). Foi horrível. Haha.

Há duas possibilidades para esta cidade, um grande romance ou uma grande guerra. Se eu acreditasse em reencarnação ou vidas passadas, teria certeza que já guerreei aqui. O desenho das ruas da zona velha, os esquemas táticos, os muros e casas, os muitos pontos de emboscada possíveis, tudo combina para se afirmar que seria realmente lindo fazer uma guerra aqui. Seria um grande ponto de resistência para um exército e um grande desafio para outro, que quisesse entrar na cidade. Engraçado isso, não? Já estive n’algumas cidades com castelos projetados para guerra, mas que seriam fáceis de invadir. Aqui não há castelos de guerra, mas esta cidade sim foi projetada para isso. Já que estamos em tempos virtuais, seria um bom cenário para inspirar um mapa para countre-strite. Eu jogaria.

O trem finalmente se põe a andar. Vazio, opostamente a quando veio. A espada de Carlomagno vai ao meu lado.

Diante da Catedral, os peregrinos deitam-se no chão, no meio da praça, para observá-la. Alguém mais fresco poderia se enojar pensando nos germes que existem no chão (Haha). Já eram seis da tarde, mas ainda havia sol quente e forte, quando o fiz e ali permaneci por quase uma hora. Sentir o chão, a energia. O magnetismo, como diria um amigo. (Re)encontrar-se em Santiago.

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário

Dois meses, morar

Morar em uma cidade é diferente de visitá-la apenas como turista. Ontem, dia 06, completou dois meses que moro aqui em Portugal, na cidade do Porto.

Morar implica algumas coisas, positivas e negativas. Conhece-se muito melhor o lugar, o “espírito” do lugar, em sua essência, suas pessoas. Mas não se conhece os lugares físicos. Não é o que dizem, que não damos valor ao lugar onde moramos? Creio que nem é questão de valor, mas de costume. Ou “naturalização”, como gostava os antropólogos e marxistas. Hehe.

Passo sempre em frente à Torre dos Clérigos, caminho para a Reitoria e a Faculdade de Direito, onde tenho ido participar dos debates da SdDUP (outro isso escrevo sobre isso), e até hoje não subi lá em cima. Não sou só eu. Quando cheguei, conheci brasileiros que estavam indo embora e antes disso foram fazer seu “passeio turístico”, pois ainda não haviam passado por alguns lugares. Há um poema que fala sobre o olhar e o real enxergar. Estou tentando me lembrar dele, mas não consigo, minha memória não ajuda (daqui uns dias, quando vier à mente de repente, num estalo, faço uma edição no post e o coloco abaixo), que fala um pouco sobre como nosso olhar se acostuma e não damos valor ao que passamos em frente todo dia.

Mas também há seu lado bom. A Ribeira, por exemplo, um dos cartões-postais do Porto, senão o principal. Turistas vão nela de dia, tiram fotos, vão embora, mas muitas vezes é só uma paisagem sem significado. Ainda não tirei nenhuma foto “turística” na Ribeira, mas vamos lá toda noite/madrugada de segunda-feira, dia da festa na Ribeira. Agora imagine a música e as pessoas a confraternizar, à beira daquele cais, com o Rio D’ouro ali a literalmente dois passos. É incrível, viver, não apenas passear.

O tempo passa rápido, disseram-me todos que já passaram por essa experiência. De fato, veja só, passa muito rápido. Dois meses já se foram. Tem sido uma experiência interessante por possibilitar conhecer algo que é diferente, mas não é assim tão diferente. Ver que ambos somos influenciados pelos Estados Unidos (e o repudiamos em conjunto), mas ao mesmo tempo nos influenciamos mutuamente, um ao outro. É ótimo experimentar novos sabores e comidas, conhecer novos lugares (embora depois do terceiro castelo, todos pareçam um tanto iguais), mas principalmente estar com pessoas interessantes e instigantes. A um terço do caminho (a principio), Porto tem sido boa.

Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário